Faz hoje três semanas que ela partiu. Durante estas três
semanas só saiu de casa para trabalhar. Fê-lo como se fosse um acto automático
que não se podia dar ao luxo de colocar atrás das costas, já que tinha
responsabilidades para com a chefia e os seus colegas.
Durante estes dias teve um nó na garganta, um nó estomago e
outro maior no corpo todo. Mal comeu e teve de fazer mais um buraco no cinto.
Cancelou as corridas com o grupo com quem seguia umas 3 vezes por semana
alegando muito trabalho, deixou a pilha de roupa suja e limpa acumular-se no
quarto de arrumações, não mudou a areia à gata quando devia e não fez a barba.
Dia sim, dia não, chorou compulsivamente como uma criança e
desejou arrancar toda a dor do peito com as próprias mãos ou com a ajuda de uma
faca afiada. Um dia com mais esperança para seguir em frente e no a seguir com
o dobro do peso do corpo para sequer se movimentar de uma divisão para a outra
em casa.
Ela levou tudo. E levou tudo de uma vez para não ter de
voltar a olhá-lo nos olhos e sentir aquela culpa que ainda hoje a deve queimar.
Ela não o queria ter feito ou talvez não daquela maneira. Ele merecia mais, merecia
que ela não tivesse cedido à sua própria estupidez.
Era sempre ela que fazia os planos e ele ficava feliz por fazer parte deles, por vê-la a criar um futuro para ambos. Se os sonhos partiam dela porquê cortar esta história de repente por uma momento que se pode chamar quase de distração? Era isto que o atormentava desde o dia em ela lhe contara o que fez naquela noite depois de sair do trabalho. Eram felizes, tinham uma relação perfeita, não discutiam e por isso ele só queria perceber o que a tinha levado a fazer aquilo. Ela nunca conseguiu responder a essa pergunta, não conseguiu ser conclusiva. Divagava, divagava até aquela conversa o cansar profundamente.
No dia da sua partida ela pareceu ter despejado um frasco de perfume inteiro. O seu cheiro impestou a casa por mais cinco dias mesmo ele tendo aberto todas as janelas para fazer corrente. Ficou o aroma nas paredes, a presença em cada porcaria que ela tinha comprado, ficou o som da sua voz quando ele abria qualquer porta ou armário. Era como um fantasma que teimava em não seguir a sua caminhada. Tudo o fazia lembrar dela e por breves instantes dava consigo a tentar desculpar o seu acto inconsequente como se o simples facto de ser humana a pudesse desculpar. Não podia, ele não podia colocar uma pedra sobre o assunto. Ele queria mais, ele queria-a a de volta mas sabia que jamais poderia deitar-se naquela cama da mesma forma. Eram sentimentos contraditórios nos quais pensava durante todo o dia sem pausas.
Mas hoje tudo era novo e ele nem sabia muito bem o que tinha mudado. Tomou um pequeno-almoço de hotel, calçou as sapatilhas de corrida e correu durante duas horas, sem pausas. No final tinha a roupa ensopada, o coração a mil e as pernas dormentes. Encostou-se a uma parede, respirou fundo e percebeu que estava tudo mais longe do que ele podia imaginar.
Love
C.